Quinta de série: O caso Evandro

Pode conter spoilers!

Quer série real e documental? Aqui no Quinta de série tem! Na edição de hoje falo da docusérie O caso Evandro da Globoplay. Criada pelo jornalista Ivan Mizanzuck, dirigida por Michelle Chevrand e Aly Muritiba e com roteiro de Angelo Defanti, Arthur Warren, Ludmila Naves e Tainá Muhringer, a produção estreou no dia 13 de maio de 2021, tendo 9 episódios, sendo um extra. O caso Evandro é baseado no podcast Projeto Humanos do jornalista Ivan (Ele dedicou uma temporada inteira somente para esse fato). A classificação indicativa da produção é de 16 anos.

A história real de Evandro Ramos Caetano, uma criança de 6 anos de idade que desapareceu em abril de 1992, no litoral do Paraná, é o foco da série. Pouco tempo depois, o garoto foi encontrado sem as mãos, olhos, cabelos e visceras e um grupo satânico confirmou que usou Evandro em um ritual macabro. Sinistro, não?! Na época, várias crianças haviam desaparecido misteriosamente e indicava que um pai de santo local era o responsável por esses sumiços. O caso ficou conhecido como As bruxas de Guaratuba e ganhou foco nos principais jornalísticos do Brasil. 

Tudo apontava para um caso de ritual satânico e logo nos primeiros episódios já existem confessos e culpados. Beatriz e Patrícia Abagge (esposa e filha do prefeito da cidade na época), além do pai de santo Osvaldo Marceneiro eram os principais. Na investigação, duas polícias antagônicas, que caminharam em lados opostos: o Grupo Tigre (elite da Polícia Civil do Paraná) e o Grupo Águia (Polícia Militar do Paraná). Além disso, o primo da vítima (Diógenes), ávido por solucionar o crime. 

Sete pessoas foram presas e confessaram o crime, concluído rapidamente, mas deixando várias dúvidas. Será que realmente elas eram culpadas no Caso Evandro?! Elas foram torturadas e o quebra-cabeça parecia que estava se encaixando, mas existiam vários revezes: a investigação não era congruente; Diógenes tinha muitos interesses pessoais e políticos com relação ao crime contra seu primo; dúvidas sobre o corpo encontrado; investigação rápida demais; sensacionalismo da mídia; e edição de fitas e materiais sob posse da polícia local. 

Esse foi um caso que teve repercussão nacional e a série mostra isso. O crime ganhou páginas e mais páginas de jornais, além de ocupar a programação televisiva. O caso na justiça durou por cerca de 30 anos e chamou a atenção do jornalista Ivan Mizanzuck que resolveu investigá-lo à fundo com um olhar apurado, bastante pesquisa e investigação que resultou na quarta temporada do seu podcast - o Projeto Humanos. 

Ivan realizou um trabalho primoroso no podcast, que foi transformado em áudio, vídeo e imagem com a série. A docusérie amplia o universo do podcast, dando fisionomia e aparência aos entrevistados, além de traduzir em imagens os fatos - inclusive tem simulações e encenações do crime incríveis, dignas de cinema e que lembram muito os simulacros que existiam no programa policial e jornalístico Linha Direta (Quem se lembra desse clássico dos anos 2000?!). 

O espectador mergulha na série logo no primeiro episódio e se prende na história. Não me lembro do caso pois tinha apenas três anos na época, mas a experiência da produção é imersiva. Mesmo sem conhecer, você se inteira de todos os fatos, a ponto de se abismar e entrar em pânico com tamanha crueldade com o Evandro. A fotografia, entrevistas, enredo e contrução da docusérie são impecáveis. Com certeza, uma das melhores séries desse ano, sem dúvidas. 

A série é repleta de entrevistados, como repórteres, jornalistas, culpados do caso, advogados, juízes, policiais, entre outros, o que enriquece o material por trazer vários pontos de vistas, lembranças, reconstruções e considerações sobre o caso. Ivan Mizanzuck é o narrador da produção e quem faz considerações plausíveis sobre os fatos, assim como detalha sua pesquisa de investigação que durou anos. 

A trilha sonora da série é incrível e trouxe a mesma vibe do podcast. Ivan criou músicas instrumentais em aplicativos sonoros e radiofônicos, ao trazer um ar misterioso e de suspense. Você se sente envolvido e perplexo também por conta da sonoridade, como pela história contada. Já a abertura foi muito bem produzida e montada. Assista-a:

Ivan é um incrível jornalista. O admiro por conta da sua perspicácia, olhar apurado, inteligência, avidez pela verdade e sua atitude incansável em investigar. Um dos melhores jornalistas que já vi! Confesso que não conhecia muito (Na verdade nada) do jornalista antes de assistir à série, mas depois passei à seguí-lo nas redes sociais. 

A repercussão da série foi tão grande que, após seu encerramento, um novo episódio foi produzido, trazendo revelações e reviravoltas sobre o caso e um dos depoimentos mais esperados de alguém que não havia sido entrevistado. A produção, assim, conseguiu responder seu principal mistério, mas não de forma óbvia e absoluta, pois ela não responde de fato. Os minutos finais tem muita poesia, emoção e estética, o que gostei pois foi um contraponto para uma história tão pesada. Até música autoral sobre o caso e os 7 culpados teve!

O Caso Evandro me ensinou que: não é recomendável acreditar no óbvio logo de cara; é preciso analisar todas as situações e pontos de vistas; não julgar a religião de ninguém é a atitude mais sensata a se tomar; a justiça humana é falha; é possível editar e esconder a verdade; existe o bom e o mau jornalismo; por causa de injustiças pessoas são condenadas; mães e famílias ainda choram as perdas de suas crianças, que hoje seriam adultas; a investigação apurada e profunda é a alma do jornalismo de sucesso; divergências e desunião são um perigo; e defender seus próprios interesses é uma cilada. Com tantos ensinamentos, acho que te convenci assistir essa série documental, não é?! Mas fica a advertência que a série tem muitos gatilhos, violência, atos criminosos e um conteúdo impactante. Conheça a docusérie que movimentou o país e se surpreenda. Uma das melhores que já assisti. Vale a pena ver esse trabalho de jornalismo investigativo em episódios. Até a próxima! J-J 

Por: Emerson Garcia