quinta-feira, 29 de junho de 2023

Assexualidade: categorias e subdivisões; tabus e preconceitos; mitos; e dúvidas


No ano passado, durante a Pride Week 2022, o colaborador Arthur Claro fez um post sobre a assexualidade bem legal e completo sobre conceitos, símbolos, bandeira e como descobrir se é uma pessoa assexual. 

O post de hoje é uma continuação do anterior. Nele focarei sobre as categorias e subdivisões; mitos; tabus e preconceitos; e dúvidas da assexualidade. A assexualidade, como aprendemos anteriormente, é uma orientação sexual que pode se manifestar de várias formas. É como se a assexualidade tivesse um leque diverso de subdivisões e espectros.

Só pra recapitular, a assexualidade é quando não há atração ou desejo sexual por qualquer gênero. Ela também pode ser conceituada quando há pouco atração ou apenas quando há vínculo emocional. Esse conceito retirei do Orgulho em movimento do Uber.

É um erro acreditar que pessoas assexuais não possuem a sexualidade. Elas possuem sim, pois não se limita à atração sexual, englobando muito mais coisas. Ela pode ser definitiva, compreender um curto espaço de tempo, ser fluida, entre outros.

Feita essa recapitulação, vamos ao post de hoje.


Categorias e subdivisões da assexualidade



A assexualidade é variável. Ela pode se referir à pessoas com desejo ou atração sexual baixa ou ausente, comportamentos sexuais baixos ou ausentes, parcerias não sexuais exclusivamente românticas ou combinação de desejos e comportamentos sexuais ausentes.  

A AVEN (Asexuality Visibility and Education Network, Rede de Visibilidade e Educação sobre Assexualidade, em português) criou algumas divisões da assexualidade para que o conceito seja de fácil entendimento. A divisão tradicional é a seguinte: assexualidade romântica e arromântica. No primeiro caso, a pessoa pode se apaixonar; no segundo, é o ser assexual que não possui interesse em relações românticas ou não sente amor romântico.

Os assexuais românticos se dividem em: heterorromânticos, homorromânticos, birromânticos e panrromânticos. O sufixo -romântico é utilizado ao ínves do -sexual para não gerar confusão com as subclassificações da assexualidade com as orientações sexuais tradicionais. Confira:

arromântico: falta de atração romântica por qualquer pessoa;
birromântico: por analogia ao biafetivo;
heterorromântico: por analogia ao heteroafetivo;
homorromântico: por analogia ao homoafetivo; e
panromântico: por analogia ao panafetivo.

A identificação também pode compreender a área cinza do gráfico da assexualidade. Como o cinza-romântico, demirromântico, demissexual ou semissexual. Estes estão no meio termo e não se consideram nem românticos nem arromânticos. Ou seja, estão entre a assexualidade e a atração sexual. Eles sentem atração sexual de forma esporádica ou somente quando formam fortes laços afetivos ou românticos com outras pessoas. Ou seja, tem que ter aquela conexão emocional razoavelmente estável ou que tenha sido criada amplamente.  



Agora, vou falar um pouco sobre as subdivisões que já foram apresentadas no post.


Românticos

O assexual romântico tem interesse em se relacionar romanticamente com a outra. O personagem Caíque, de Travessia, era um assexual romântico que se relacionava romanticamente com Leonor, mas quando ela queria ultrapassar o limite para o sexo, havia certa repulsa. As pessoas assexuais românticas são carinhosas, se envolvem emocionalmente com a outra, mas não há atração nem prática sexual. 


Não-românticos ou arromânticos

O assexual não-romântico ou arromântico não possui interesse ou disposição de possuir um relacionamento amoroso e está em paz com essa decisão.


Área cinza


Na área cinza da assexulidade estão as pessoas que praticam sexo. Nessa área há outras subdivisões baseadas nas características de cada um. Nesse setor, há os demissexuais, os sapiossexuais (Indivíduos que se sentem atraídos sexualmente por pessoas muito inteligentes. Bela Gil recentemente se classificou dessa forma) e os grayssexuais, os Gray-A (Indivíduos que transam em situações específicas). A demissexualidade e a sapiosexualidade são duas subclassificações mais conhecidas quando falamos de assexualidade de forma mais literal. Quando utilizamos esses termos, nos referimos à assexualidade estrita e/ou plena, isto é, a pura falta total de desejo sexual. 

Essas classificações e subdivisões da assexualidade ainda estão sendo discutidas, pois tem se percebido que nem todos os assexuais se identificam com elas. É importante que o assunto seja estudado cada vez mais, com o intuito do didatismo, informação e autoconhecimento de cada pessoa assexual. 

Outras palavras e frases da comunidade assexual

Muitos outros termos podem ser utilizados para a assexualidade. É isso que você irá ver agora. Confira!

Friend-focused: relacionamentos não-românticos supervalorizados;
Squishes: paixões não-românticas;
Zucchinis: relacionamentos queer-platônicos;
Alossexual: termo para indivíduos do lado oposto da sexualidade;
Assexual estrito: pessoa que não sente atração sexual em nenhum momento;
Frayssexual: pessoa que sente atração sexual apenas quando não há um vínculo afetivo criado;
Cupiossexual: pessoa que não sente atração sexual por outros, mas desejo e vontade de ter uma vida sexual ativa; e
Assexual fluido: pessoa que ora se sente demissexual, ora grayssexual. Ou seja, alguém cujos desejos sexuais flutuam ocasionalmente. 


Atração ≠ Desejo



Atração e desejo são duas coisas totalmente diferentes e é preciso conceituá-las. Há a atração sexual que envolve apenas o ato sexual - a vontade de sexo somente pelo sexo; há o desejo sexual/libido que é a vontade de estimulação sexual, não necessariamente de sexo, como vontade de gozar ou sentir prazer; há a atração romântica, que é ficar apaixonado ("caído de amor") por alguém ou alguéns; e a atração estética, achar alguém bonito e apreciar essa beleza. Ter esses conceitos definidos é de suma importância para se entender a assexualidade. 


Tabus e preconceitos



Há muitos tabus e preconceitos instaurados com as pessoas assexuais, isso se deve, sobretudo ao desconhecimento dos conceitos sobre a assexualidade. Pessoas assexuais, ao longo da história, lutaram para serem compreendidas, reconhecidas e possuírem sua visibilidade.  

Pessoas interpretam de forma equivocada o termo, além dele não ser tão conhecido e pouco discutido. Há uma descrença sobre a pessoa ser assexual e comentários, como: "será que você é assexual mesmo?" e "te ignoro porque desconheço esse termo!", são bem frequentes.
 
Há muito preconceito, julgamentos equivocados e confusão. Cada vez mais, as vozes assexuadas gostariam de ser ouvidas e compreendidas. É por isso que indivíduos, ativistas e grupos contam suas histórias para um público mais amplo e desfilam em paradas LGBTQIAPN+ pelo mundo. 

Entre os equívocos estão: acreditar que a assexualidade é a mesma coisa que celibato, e não é; ou que é uma escolha, na verdade é uma orientação; que só é assexual se nunca sentiu atração sexual ou praticou sexo (Na verdade é um espectro, como vimos); que é sinônimo de arromantismo, mas vimos que não. 

Tem se tornado comum fóruns, bate papos e o Dia e Semana da Visibilidade Assexual para retirar a assexualidade das sombras e colocar luz no termo. Assim, é até mais fácil para que pessoas possam declarar sua orientação. 


Mitos



Após os tabus e preconceitos, os mitos sobre a assexualidade são levantados. Nesse tópico apresento 10 mitos sobre a assexualidade:

Mito 1: Assexualidade não existe

Tanto existe que é uma orientação sexual, conceituada e reconhecida pelas pessoas. Também há categorias, subdivisões e variações, como apresentei. 


Mito 2: Assexuais são pessoas frias e incapazes de construir relações afetivas

Assexuais podem, sim, construir relações afetivas, sejam românticas ou não.


Mito 3: Assexualidade é uma forma de celibato ou abstinência

Esses conceitos são bem diferentes entre si. Assexualidade é uma orientação sexual, enquanto o celibato e abstinência são comportamentos. A pessoa assexual não sente, ou sente pouca atração sexual e pode ou não, praticar sexo. A celibatária não pratica sexo por algum motivo, nem sempre porque escolheu isso; e a que pratica a abstinência ela decidiu se abster-se do sexo. Os conceitos se sobrepõem, mas não se confundem. Uma pessoa assexual pode ser celibatária ou abstinente, sem que isso fique confuso. 


Mito 4: Assexuais não enfrentam preconceitos, opressão e discriminação

Nós já vimos nesse post que enfrentam, sim. Pesquisas mostram as precariedades e vulnerabilidades associadas com a visibilização e não reconhecimento das experiências assexuais. Isso leva a taxas de suicídio e tentativa, retraimento social e problemas interpessoais. 


Mito 5: Assexualidade é resultado de doença, trauma ou influxo hormonal

Assexualidade não é doença. Os assexuais não possuem traumas e/ou alteração dos níveis hormonais. Não é depressão, nem nada disso. A baixa atração/desejo sexual não tem nada corporal, neurológico ou hormonal. 


Mito 6: A assexualidade é uma criação moderna da internet

Ela foi conhecida mais pela AVEN, comunidade assexual virtual, fundada em 2001, mas há registros de ativistas e discussões anteriores. Um dos registros mais antigos é do Manifesto Assexual, escrito por Lisa Orlando, publicado em 1972 pelo New York Radical Feminists (NYRF). 


Mito 7: Assexuais não praticam sexo e não sentem desejo sexual

Sim, eles podem praticar, como vimos de acordo com as categorias e subdivisões. A prática de sexo pode ser para satisfazer parcerias, satisfação pessoal ou para ter filhos. Ou seja, muitos assexuais podem encontrar no sexo um atividade de prazer ou uma ponte de conexão com suas parcerias.  


Mitos 8: Pessoas assexuais são assexuadas 

O termo assexuado pode ser confundido com o assexual. Ambos podem ser usados para se referir à mesma coisa, mas são diferentes. Assexuado é a pessoa que não possui órgão sexual ou a reprodução ocorre sem intervenção de dois sexos, de acordo com a biologia. Já assexual é a que tem a assexualidade como sua orientação sexual. Chamar uma pessoa assexual de "assexuada" é um tanto preconceituoso e pejorativo. 


Mitos 9: Não é possível amar sem sexo

Um dos grandes mitos levantados é que as pessoas assexuais não são interessadas em relações amorosas. Se é possível fazer sexo sem amor, porque não é possível o contrário - amor sem sexo? Esse é até um questionamento que Caíque faz para Leonor. Pessoas assexuais podem, sim, manter relacionamentos amorosos!


Mitos 10: Assexuais se relacionam apenas com outros assexuais

O relacionamento romântico pode ocorrer entre qualquer pessoa romântica, pois se trata de emoção e conexão. Assexuais se apaixonam e mantém relacionamentos com pessoas de qualquer orientação sexual. O personagem Caíque, por exemplo, se conectou emocionalmente com Leonor e já estava mantendo um relacionamento de namoro com ela, apesar dela não entender isso. 


Dúvidas


Melhor que morrer com a dúvida e ficar "a ver navios", é sanar todas as dúvidas. Por isso, nesse tópico, vou sanar algumas sobre a assexualidade.

Se eu não sinto atração sexual, necessariamente sou assexual?

Não. A falta de atração sexual ocorre por vários motivos, e a assexualidade é apenas um deles. Algumas pessoas não se sentem atraídas por homens ou mulheres por conta de traumas, problemas hormonais ou transtornos psicológicos. Aqueles que não se sentem confortáveis e bem por conta da falta de interesse sexual devem procurar ajuda médica.


Eu não sinto atração sexual, mas já me apaixonei. Significa que não sou assexual?
   
Parte dos assexuais afirma já ter se apaixonado. O sentimento de amor e a atração sexual não estão necessariamente associados. 


Se eu já fiz sexo, então não posso ser assexual, correto?

Errado. As pessoas praticam sexo por diversos motivos, que não necessariamente estejam ligados à libido própria. Pode ter a ver com satisfação do parceiro, manutenção de relacionamento ou para entender como a sexualidade se manifesta. Esses são aluns dos motivos que levam os assexuais a se relacionarem sexualmente com outras pessoas.


Todo assexual é gay?
 
Não, embora existam alguns assexuais que também dizem serem gays, ou seja, homorromânticos. 


O que eu faço para ser assexual ou para me tornar assexual?

Nada. A assexualidade não se constitui por algo que se faça. Pode-se ser assexual praticando ou não sexo, beijando ou não beijando, amando ou não amando. É algo mais subjetivo que só diz respeito ao próprio assexual. Não há método.


Sempre tive atração sexual, mas, de repente, deixei de senti-la. Virei assexual?

Depende. A sexualidade humana é fluida e pode ser modificada no decorrer dos anos. Contudo, é preciso estar em alerta pois a falta de interesse sexual pode ser um sintoma patológico. Por isso, é importante acompanhamento médico, nesse caso. 


Sexo, para mim, é sinônimo de pecado, sujeira, doença e imundice. Acredito que todos que fazem sexo merecem morrer ou ir para o inferno. Sou, então, assexual?

É preciso ter cuidado com nossos julgamentos e ideias. O sexo não é sujo e não é uma doença. Se você acredita ser assexual por ter esse tipo de preconceito, é melhor rever seus conceitos. Talvez seja interessante procurar tratamento psicológico. 


Me identifico com todas as características da assexualidade, mas pratico a masturbação. Sou assexual mesmo assim?

Talvez. A masturbação pode ter vários significados, não estando ligados, necessariamente, à fantasia da prática sexual. Para muitos assexuais, a masturbação é uma necessidade fisiológica, e que a praticam sem pensar em nada. Mas isso varia de pessoa para pessoa. 


Queria ser assexual para não sofrer mais. É possível?

A ideia de que assexual não sofre é uma ilusão. Os assexuais possuem suas próprias angústias e problemas. Mudar sua orientação sexual não é a solução para os seus problemas. 


Ser assexual é tão triste quanto parece ser?

Mito. A orientação sexual é apenas um dos elementos que compõem os seres humanos e a felicidade não se associa somente à ela. Essa ideia de que sexo é importante e essencial é apenas uma supervalorização da prática, mas praticar não é pré-requisito para alcançar a felicidade.  


A assexualidade é uma fórmula?

Não. É uma questão bem ampla e complexa para se limitar à definições. Por isso, pesquisa, reflita e compartilhe!


Conclusão



A palavra assexual é nova, sendo incorporada ao dicionário apenas em 2021. As categorias e subdivisões, então, é algo recente e ainda tem se estudado muito sobre o assunto. A assexualidade é uma orientação sexual e está contida naquele 'Azinho' da sigla. 

Escolher ser assexual não é fácil, já que a sociedade é extremamente sexualizada. Essa orientação ainda gera muito tabu e preconceito. Mas é algo totalmente normal e a orientação merece ser respeitada. Ainda hoje em dia, essa orientação é conhecida como "orientação invisível"

A empatia, compreensão e respeito é fundamental em qualquer orientação. Ainda mais se você entrar em um relacionamento assim. É preciso conhecer e respeitar os limites do parceiro. Que bom que foi criada a Semana da Consciência Assexual para que a assexualidade seja melhor compreendida. 

É preciso, antes de tudo, entender que a assexualidade: não é doença; há mais mulheres que homens assexuais; não é questão de baixa libido; as pessoas assexuais podem ter um relacionamento normal; assexuais também transam; e assexuais se consideram parte da comunidade LGBTQIAPN+. 

Você pode saber mais do assunto no site Assexualidade, clicando aqui





Por: Emerson Garcia

4 comentários :

  1. Publicação didáctica muito interessante que muito gostei de ler. Foca aspectos assertivo, verdadeiros, oportunos. Muito bom.
    Feliz fim de semana

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  2. ótima publicação . Acho que somos assexuais até encontrar alguem que sentimos atração Abraço

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  3. Realmente é um post bem completo. Eu já tinha ouvido falar do termo, porém isso ainda é bem confuso para mim. E vendo agora as definições, é bastante informação mesmo, o que faz sentido que muitos ainda se confundam também.
    Bjks!

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  4. Buen fin de semana 👍
    Gracias por tu huella

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