quarta-feira, 4 de outubro de 2017

Performance do MAM: arte ou pedofilia?





Após ele, questões tem sido levantadas: A interação da criança com o homem nu é arte? Liberdade artística? Até que ponto a performance transgrediu os Direitos da Criança e do Adolescente? Ao invés de arte, o episódio é visto como apologia ao abuso infantil? O vídeo em si é um abuso infantil? Ele tem teor erótico e sexual?

Nesse post irei analisar todos os lados da questão, bem como darei voz ao MAM e ao Ministério Público (MP). Nenhuma opinião será suprimida. Desse modo, explorarei os seguintes tópicos: análise do vídeo; posição do MAM; do Ministério Público; contexto da performance (Inspiração e baseamentos); e repercussão do caso nas redes sociais



Análise do vídeo


O vídeo em questão provavelmente foi gravado por uma pessoa que assistia a performance. Aliás, é comum que expectadores levem celulares para exposições de arte para registro. Na cena, portanto, é possível ver vários indivíduos que observam atentos e outros que filmam. Logo após, o cinegrafista amador jogou as imagens nas redes sociais.

Agora, assista-o, e eu volto com a análise depois:






No centro do tatame encontra-se um homem totalmente nu, imóvel, com braços e pernas abertos e olhos fechados. Ao redor dele, há uma mulher adulta e também uma menina. Ambas interagem com o homem nu. Parece que a mulher possui autonomia para tocar no indivíduo e incita que a menina também o toque, sempre sob sua supervisão. De acordo com nota do MAM a mulher é a mãe da garota. 

Ambas, portanto, ficam de joelhos passeando ao redor do homem. A mãe da garota toca em suas pernas e pés. Logo depois sua filha também o toca nessas mesmas partes e me parece que esboça sorrisos e um ar de garota travessa.

Essa análise literal do vídeo faz-se necessária para que o entendamos com fidedignidade. Até porque, quando soube da polêmica, fui levado a acreditar que a menina tinha tocado as partes íntimas do indivíduo ou qualquer outra, o que na verdade não aconteceu; e que ela tocou seu corpo por livre e espontânea vontade - o que foi uma pseudo-verdade disseminada nas redes sociais, escondendo-se seu real contexto e a supervisão da mãe. 

A partir do vídeo posso inferir que não tratou-se de abuso sexual e nem de uma irresponsabilidade dos pais. Não foi abuso sexual porque o homem estava de olhos fechados e inerte, provavelmente com o pênis flácido, e a menina o tocou, com inocência, em suas pernas e pés. Ela não o tocou (E aqui terei que ser bem direto) em seu pênis e nem o homem a tocou em alguma parte. Não foi o caso da mãe explicar para a menina o que era um pênis, porque ela sequer o viu. 

Por sua vez, não foi de irresponsabilidade dos pais, porque a menina estava acompanhada de sua mãe e sob sua supervisão. Acredito que a mãe foi cuidadosa ao interagir com o homem da maneira correta e fazer com que sua filha também interagisse assim. 

Mas, ainda há outros que acreditam que foi irresponsabilidade do MAM...



O que diz o MAM?


Muitas pessoas protestaram contra o Museu sobre esse fato e disseram que a organização era a favor da pedofilia e do abuso sexual de crianças e adolescentes. O MAM, inclusive, registrou vários boletins de ocorrência contra as agressões. Contudo, na hipótese longínqua de existir algum culpado ou responsável pelo fato, este com certeza não seria o museu, mas a mãe da criança, que inclusive estava em cena com ela. 

É preciso colocar 'os pingos nos is'. O museu é responsável pelo evento e performance. Por se tratar de um museu de arte moderna, é razoável que tenha nus artísticos. No local da apresentação estava sinalizado seu teor, que não era erótico, sexual ou qualquer coisa do gênero, mas artístico e baseado na escultura Bicho de Lygia Clark (Mais detalhes em tópico posterior). "Mas Emerson, o museu foi responsável pela interação da mãe e da criança com o homem". Será o museu o responsável, em primeira instância, por aquela criança, ou sua mãe?! 

Na última quinta-feira (28) o MAM divulgou em sua fanpage no Facebook uma nota de esclarecimento. Veja:






Destaco alguns trechos:

1- "Sala sinalizada": O museu sinalizou o local da apresentação, alertando sobre o teor desta e informando que haveria ali cenas de nudez artística. Não sei como foi esse tipo de aviso, se por meio de cartazes ou luzes luminosas, mas o que importa é que a sala estava sinalizada. Contudo, vale ressaltar que a sala não possuía uma classificação indicativa, por isso é explicado a presença de uma menina

2- "Não tem conteúdo erótico": Ao contrário do que se disseminou, a performance não tem conteúdo erótico nem sexual, mas apenas artístico. Aliás, o conteúdo trata-se da interação com objetos inanimados, baseada na obra de Lygia Clark. 

3- "O material apresentado não apresenta este contexto": É visível a manipulação do conteúdo da obra e a retirada e supressão de contextos da mesma. Em momento algum, quando divulgou-se o vídeo, foi falado que era uma performance baseada em uma obra artística e muito menos que a criança estava sob a supervisão da mãe.

4- "O Museu lamenta as interpretações açodadas e manifestações de ódio e de intimidação à liberdade de expressão": E foram vários os protestos desnecessários contra o museu e a performance que variaram entre "Isso não é arte, é crime!" até "Museu safado que faz apologia a abuso infantil e estupro de vulnerável!".

5- "Diálogo e debate plural pautados pela racionalidade e a correta compreensão dos fatos": De fato, a compreensão da arte é individual e múltipla, mas as obras artísticas tem um porquê e um motivo de serem apresentadas de uma certa forma e não de outra. Por isso, é preciso ser racional e compreendê-la de forma correta, independente de suas reações próprias e sensibilizações sobre ela




Salas sinalizadas e classificação indicativa para exposições





















Há uma diferença entre ter salas sinalizadas e classificação indicativa em exposições. Enquanto naquela a censura é subjetiva, nessa é objetiva. Recentemente, o encerramento antecipado da exposição Queermuseu no Santander Cultural de Porto Alegre colocou em discussão a adoção ou não da classificação indicativa em exposições e mostras de artes visuais, assim como já ocorre em obras audiovisuais, cênicas e videogames. Mas essa seria a medida a ser adotada?

Voltando para o vídeo polêmico, se a sala estava sinalizada a mãe sabia do teor de seu conteúdo e definiu que sua filha ver a cena era natural e que não traria prejuízos mentais e psicológicos para ela. Por ser um ambiente com alerta, cabe aos responsáveis de pessoas menores de 18 anos definirem se o seu tutelado pode adentrar naquele espaço ou não. Já se a sala tivesse uma classificação indicativa, tais como: "Nessa sala só é permitida a entrada de pessoas com mais de 16 anos" ou "Nessa sala só é permitida a entrada de pessoas com mais de 18 anos", certamente a garota não poderia estar ali.

Contudo, criar essas classificações indicativas para exposições e mostras de artes visuais poderia criar empecilhos na natureza subjetiva das obras, de acordo com o curador da exposição Queermuseu,  Gaudêncio Fidelis (com grifos):

"O audiovisual ou as artes cênicas estão mais próximas da realidade, é mais fácil analisá-las a partir de critérios objetivos. As artes visuais estão relacionadas à representação, mesmo figurativas elas não são o objeto em si. Que critérios poderiam ser adotados para esta avaliação? A leitura de uma obra é, antes de tudo, o que o artista determina que ela seja. Como é possível determinar à obra uma leitura ou uma narrativa que não seja a do autor?".


Se a classificação indicativa for adotada em exposições gerará muitas divergências e polêmicas. Quais seriam os critérios, já que trata-se de algo subjetivo? O mais correto seria manter as salas sinalizadas e o bom senso seria de cada pai ou responsável que levasse seu filho até aquele recinto.



O que diz o Ministério Público?



O MP investiga o vídeo que circula na internet e analisa se ele fere o Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como os Direitos dos mesmos. O órgão também investigará sobre a responsabilidade do MAM e da mãe da criança, de modo a encontrar, ou não, qualquer infração ou irregularidade. Uma vez encontrada, será aberto um processo pela justiça criminal. 

De acordo com o MP, desde 1988 os eventos de arte possuem classificação indicativa. Contudo, pelo que entendi, a sala não possuía essa classificação, apenas uma sinalização. Desse modo, caberá ao órgão investigar quais foram os critérios adotados pelo MAM e se foi descumprida a regra de classificação indicativa. De acordo com o promotor de justiça da Infância e da Adolescência Eduardo Dias, responsável pelo caso, é necessária essa investigação (com grifos):

“Existe uma regra específica para eventos dessa natureza, como exposições de arte ou instalações, e ela é pautada pela autoclassificação, os curadores, examinando o evento, vão fixar a idade de acesso do público infantojuvenil.”



Merece investigação também a exposição da criança na internet e redes sociais, já que o vídeo divulgado não escondeu o seu rosto nem foi colocado um 'borrão'. A exposição em ambiente virtual também poderia ser prejudicial à criança. Desse modo, é preciso chegar também até as pessoas que divulgaram as imagens e fizeram upload do vídeo na internet. Será que elas queriam denunciar o fato ou expor a criança? (Um pergunta boa a ser discutida, de acordo com o que os seriadores tem aprendido com Black Mirror). 

Inclusive, anexado ao vídeo que foi enviado ao MP, um denunciante disse assim (com grifos):


"Venho por meio deste me manifestar e denunciar a pedofilia, promiscuidade e o abuso sexual. E incentivo deste, patrocinado pelo MAM, Museu de Arte Moderna de São Paulo, que, de maneira sutil e criminosa permitiu a entrada de criança, e a exposição de nudismo diante dos olhos da mesma, segundo eles com o consentimento da mãe, ferindo a constituição e as leis de proteção aos menores."


Será que o intuito do denunciante era mesmo o de denunciar? (Fui redundante de propósito!) Isso precisa ser questionado, uma vez que ele estava em uma sala com nu artístico e talvez pudesse apreciar a obra apresentada. Aliás, será que todas os indivíduos presentes ficaram chocados? Disse no primeiro tópico desse texto que muitos ficaram atentos e outros até mesmo gravavam a performance. Se você quer denunciar uma apologia ao abuso infantil e de vulnerável (em uma hipótese longínqua!) qual seria a sua atitude?! A de filmar, claro, mas será que todas as pessoas que filmaram estavam em desacordo com a performance?

O que faço aqui são conjecturas e reflexões (à nível de Black Mirror #sóquenão), mas as investigações e o veredito final caberá ao Ministério Público!


Contexto da performance














O nome da performance que gerou toda essa polêmica chama-se La Bête, do artista Wagner Schartz, e abriu o 35º Panorama da Arte Brasileira no dia 26 do mês passado, em uma sessão única. Esta foi baseada na escultura Bicho, da artista Lygia Clark. Leia o que o MAM disse em detalhes:





Assim como em La Bête, em Bicho o expectador pode interagir, criar modificações e articulações com a obra. As esculturas de Bicho eram geométricas, de várias formas e com dobradiças que ajudavam na interação. Aqui você pode se aprofundar melhor. Com as esculturas, o expectador era sujeito ativo (com grifos):

"A partir desse ponto o expectador passa a ser figura atuante para a obra, e a intenção não era criar formas que se pareçam com verdadeiros animais, mas sim que essa linha orgânica, essa profundidade dos planos e essas forma transformadora obtivesse a característica de obra viva, atuante."


Abaixo você pode ver uma delas:







É por esse motivo que a criança toca no corpo do homem, e não por conta de um erotismo e um teor sexual!



O nu artístico choca as crianças?







Antes de tudo, o nu integra a arte há tempos. Ele está presente em filmes, novelas, séries e até mesmo em aberturas de novelas e vinhetas de carnaval. O nu artístico é algo que não deveria causar choque nas pessoas. Mas será que este poderia causar em crianças? E qual seria seu efeito nelas? As erotizaria? Causaria danos psicológicos e mentais nelas?

Sou da época em que crianças dançavam as músicas do É o Tchan! - que tinha no grupo mulheres seminuas; em que a juventude assistia o Domingo Legal e via, sem problema algum ou censura, a Banheira do Gugu. Lembro, como se fosse hoje, que tudo isso não transgrediu a infância delas e que nem a banda, o programa ou o quadro foram censurados ou banidos. Nada disso as erotizou ou as trouxe transtornos. Ao contrário do que tenho percebido hoje: crianças que cantam a música de outra que fala "Ela quer pau" e outros absurdos (como falei aqui); e meninas que imitam uma outra que rebolava até o chão (veja aqui). 

De fato, a erotização infantil hoje em dia está exacerbada. Mas quais seriam os efeitos de uma criança em uma sala artística com um homem nu? Ela poderia até ficar chocada, mas toda regra tem sua exceção, como acredito que houve nesse caso. A menina não ficou intimidada, constrangida ou invadida. Ela tocou as pernas e os pés do homem não no sentido erótico, mas no sentido lúdico e divertido. E desafio que alguém me mostre nos comentários onde houve erotização e sentido sexual no vídeo!

Sobre a imagem que abriu esse tópico, de fato não há diferença nenhuma entre a cena de um homem nu no museu e da Globeleza na TV, mesmo que uma menina esteja naquela cena e não nessa! "Ah, Emerson, mas a criança tocou no corpo do homem! Já pensou se tivesse uma criança tocando a 'teta' da Globeleza?" Daí eu pergunto a você: qual foi o tipo de toque da menina?


Repercussão


No último domingo (01) o MAM publicou uma nota de posicionamento sobre as repercussões negativas que a performance tem gerado como agressões, atos de violência e invasões ao museu. Leia abaixo:






As manifestações tem tomado vias violentas que, em minha opinião, são desnecessárias. Para esses protestantes, se existe um culpado é o museu, mas ninguém foi atrás da mãe para questionar o porquê dela ter deixado sua filha participar da interação, né?!

Nas redes sociais, a repercussão tem sido bem abrangente. O pastor Silas Malafaia, por exemplo, publicou um vídeo em que chama os artistas e o museu "de bandidos, por financiarem a pedofilia e erotizarem as crianças". Veja:







Por outro lado, vários famosos e pessoas comuns se posicionaram contra a performance do MAM ao dizerem que "ISSO NÃO É ARTE! MAS PEDOFILIA!".


Uma publicação compartilhada por JesusCopy (@jesus_copy) em































Já outros foram a favor à performance, à arte e ao Museu de Arte Moderna (MAM).





"Nudez, por si só, não é pornografia.
Performance artística não é pedofilia.
Exposição não é incitação; é reflexão.
A carência de educação e cultura
Leva tudo o que não te agrada à censura.
#SomosTodosMAM"




Arte ou pedofilia?


Em minha opinião, a performance é uma arte, embora traga uma criança que toque os pés e pernas de um homem nu. Acredito que se houvesse algum teor sexual ou erótico, a cena em questão não seria arte, mas pedofilia

E pra você? A cena foi arte ou pedofilia? Por que? Diga aqui nos comentários! Adoro colocar lenha na fogueira e adorarei debater esse tema com você! J-J


Por: Emerson Garcia

19 comentários :

  1. Gerou bastante burburinho tudo isso. Eu acredito que a pessoa está fazendo arte lá também, e acho que os pais da criança não deveriam ter entrado com ela sabendo disso, ou talvez o museu deveria restringir a entrada de crianças, mas sei lá.. Acho que não foi pedofilia.

    www.vivendosentimentos.com.br

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    Respostas
    1. Muito burburinho mesmo. Uma das opções era o museu restringir a entrada de crianças também.

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  2. Eu vi meu pastor falando sobre e o vídeo do André. E achei um absurdo , não acredito que seja pedofilia em si mas que acho um afronto e uma quebra de moral sim.
    Abraços


    http://www.cherryacessorioseafins.com.br

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  3. Hoje em dia tudo está sendo motivo para ódio e discordar. Gostei muito da sua ideia de mostrar ambos os lados e ainda opinar, parabéns. A minha opinião é igual a sua.

    Arthur Claro
    http://www.arthur-claro.blogspot.com

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  4. Eu concordo contigo, acho que é arte e por estar sinalizado, acho que o Museu não deve ser penalizado. O melhor seria a mãe não ter levado a filha até lá, mas né... Enfim, gostei da análise dos dois lados, Emerson.
    Um beijão,
    Gabs | likegabs.blogspot.com ❥

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  5. Antes de mais nada,bela matéria JJ,parabéns,quanto a minha opinião,não vejo como pedofilia muito menos como arte,e não concordo com este tipo de exposição,a verdade é que o público brasileiro por ter em sua maioria uma religião,não está preparado para este tipo de situação ainda mais envolvendo crianças,abraço,,
    http://lorraneejunior.blogspot.com.br/

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  6. É arte sim, mas acho que o erro maior foi da mãe, por ter levado a criança.
    Bjs!

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  7. Achei legal a ideia do post de trazer várias opiniões diferentes.
    Mas eu mesmo não concordo com esse tipo de arte, se é que posso considerar tal ato como arte.

    Blog: O Planeta Alternativo

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  8. Para quem não é e não faz parte do meio de arte entende como pedofilia. Gostei do post.

    Um beijo,

    My Pure Style x My Instagram x My Facebook 

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  9. Parabéns pelo post Emerson.
    Gostei, pois deixou claro os argumentos dos dois lados. Na minha opinião, não consigo entender como uma pessoa nua, mesmo estando dentro de um museu, pode ser considerada uma arte.
    A outra questão, sobre a criança, mesmo que a mãe ou o pai autorize, temos leis que protegem essas crianças, se perante a lei houve algum crime, que sejam responsabilizados, não acho que seja arte este tipo de exposição, e também não acho que é pedofilia,mas uma situação em que uma criança não poderia está presente diante de um homem nu.
    Valeu!!!

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