quarta-feira, 24 de junho de 2020

Saúde LGBTQ+ no Brasil



Seguindo com a Semana do Orgulho LGBTQ 2020 por aqui, falarei dessa questão que muito pouco é tratada como prioridade na sociedade. Nosso Sistema de Saúde pode não ser o mais eficiente, mas ele funciona. Comparado com muitos outros Sistemas de Saúde do mundo, o SUS é gratuito e oferece muitos tratamentos para a população brasileiro sem custo nenhum.

Contudo, ele precisa de muitas melhorias para atender melhor não só a população LGBTQ+, como também seus outros milhões de brasileiros. Nosso texto hoje vai ser focado nessa comunidade, mas esperamos que as melhorias que possam a aparecer possam ser expandida para todos.


Comunidade LGBT: definições



Nos anos 90, a sigla que representava a comunidade não era como conhecemos atualmente (como já vimos algumas vezes aqui no blog). Nessa época, era utilizado GLS (Gays, Lésbicas e Simpatizantes) para abranger todas as pessoas que não faziam parte dos costumes heteronormativos. Entretanto, essa sigla era muito excludente, deixando de foras outras orientações sexuais e identidades de gênero. Com isso, ela foi atualizada para LGBTQ+.

Com essa nova sigla, novas letras foram adicionadas para aumentar a representatividade da comunidade. Letras como B de bissexuais, T de transsexuais, Q de queer além do “+”, que representam outras identidades de gênero como gênero-fluido e não-binário, e orientações sexuais como a panssexualidade.

Com isso, alguns esclarecimentos são necessários. Como também já foi mencionado aqui em outras publicações, entende-se como orientação sexual o desejo de se relacionar afetiva e/ou sexualmente com outro indivíduo, seja ele do mesmo gênero que o seu ou não. Já no caso da identidade de gênero diz respeito a como a pessoa se enxerga na sociedade, como sendo do gênero masculino, feminino, ambos ou nenhum.


Histórico


Desde muito tempo atrás essa comunidade é alvo de preconceito. No início da década de 80, em Los Angeles, cinco homens jovens foram diagnosticados com doenças como candidíase oral, citomegalovírus (CMV), pneumonia por Pneumocystis Carinii, Sarcoma de Kaposi (SK) e sintomas como emagrecimento e febre persistente. Estes pacientes apresentavam um quadro de doenças oportunistas, aquelas que aproveitam a baixa imunidade de um indivíduo para se instalarem.

Ainda desconhecida pelos cientistas e médicos da época, os dados coletados indicavam que a doença era transmitida por via sexual ou contato com sangue de pessoas infectadas. Ainda com o agente infeccioso desconhecido, muitos nomes foram dados para a tal doença: câncer gay, pneumonia gay, síndrome gay, e por fim, GRID (Gay Related Immune Deficiency). Em 1982, a doença foi renomeada para Acquired Immunodeficiency Syndrome (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida), ou AIDS. 

No ano seguinte, o vírus causador da doença foi isolado no Instituto Pasteur, na França, pelo virologista  Luc Montagnier. Três anos depois, em 1986, o vírus foi nomeado como HIV (Human Immunodeficiency Virus), o vírus da imunodeficiência humana. 



Por ter seus casos identificados inicialmente em pessoas da comunidade LGBTQ+ da época, os nomes como “câncer gay” e “doença gay” acabaram se perpetuando por muito tempo, causando reflexos que ainda são visto até os dias atuais. Uma grande parcela da comunidade religiosa da época acreditava que isso era uma forma de punição para indivíduos que tivessem práticas sexuais diferentes das consideradas normais, assim como aqueles que fazem uso de drogas ilícitas, e essa imagem permaneceu por bastante tempo (e ainda existe nos dias atuais). O que era observado da época não era que o HIV era uma doença que poderia atingir qualquer pessoa sexualmente ativa, e sim que era a doença dos gays.

No início não acreditava-se que a transmissão ocorria com o compartilhamento de seringas, contato com sangue de pessoas contaminadas e relações sexuais desprotegidas, mas sim que acontecia entre indivíduos com comportamentos irresponsáveis, anormais, e assim, Deus estaria os punindo por seu comportamento inapropriado.

A mulher esteve escondida das estatísticas científicas, desde o início da pandemia de AIDS até o final dos anos 80, o que contribuiu para que a doença fosse atribuída à homossexuais masculinos devido ao próprio preconceito que estes já sofriam da sociedade. Contudo, mulheres consideradas “da vida” também pareciam estar ocupando um espaço para a disseminação da doença, porém era mais fácil apontar um culpado, especialmente quando os princípios da sociedade iam contra todo o comportamento daquela comunidade.



Culpados pela origem da doença, assim como com a sua disseminação, os homens gays eram definidos pela sociedade como promíscuos, e a culpabilidade em cima deles só aumentava com o crescimento no número de soropositivos. Um pensamento que muitos hoje em dia, infelizmente, ainda compartilham. Atualmente já sabemos que essa enfermidade é transmitida não só por pessoas homossexuais, como também por pessoas heterossexuais, mas mesmo assim a doação de sangue por pessoas homossexuais ainda é proibida em muitos países ao redor do mundo.

No final de 1991, a Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgou um estudo que indicava que o maior disseminador do HIV eram em relações entre homens e mulheres, contrapondo tudo o que era dito na época. Portanto, seguindo o pensamento antiquado desse tempo, algum indivíduo teria que ter tido relações sexuais com algum portador da doença que fosse homossexual masculino e depois tido relações com uma mulher para que isso pudesse acontecer, novamente entrando em um assunto delicado que seriam os famosos “enrustidos”.

Por volta do mesmo período, iniciavam-se estratégias de prevenção contra o alastramento do vírus do HIV, procurando conscientizar a população, não só os homossexuais da época, mas também homens e mulheres heterossexuais.

Mesmo antes da AIDS, a comunidade LGBT já era extremamente marginalizada. Em diversos países ao redor do globo, estes indivíduos eram submetidos a tratamentos dos quais prometiam uma “conversão sexual” que os trariam de volta à “normalidade”. Isso ocorria porque a homossexualidade nesta época ainda era considerada uma doença e era referida como “homossexualismo”.

No contexto da homossexualidade como patologia, muitos procedimentos cirúrgicos eram adotados para tratar o “homossexualismo” que era diagnosticado nos indivíduos. Estratégias como vasectomia, histerectomia, ovariectomia, clitoridectomia, entre outros. Além destes, métodos como tratamento de choque, hipnose, tratamento hormonal, tratamentos com estimulantes ou antidepressivos sexuais, entre outros, também estão na lista de estratégias utilizadas nesse tipo de abordagem.



Durante o período entre guerras, a Alemanha nazista resolveu “tratar” homossexuais, os forçando a fazer um tratamento hormonal e a terem relações sexuais com prostitutas. Segundo a ideologia deles, era necessário tratar estes indivíduos para que eles pudessem retornar a prática de reprodução (lembra a ideia de alguma outra pessoa nos dias de hoje?). Contudo, estes indivíduos acabavam sendo castrados com o intuito de impedir que estes sentissem qualquer tipo de prazer sexual, visto que os procedimentos de “cura” não eram eficazes.

Finalmente, em maio de 1990, a OMS, em uma Assembleia-geral, retirou a homossexualidade da lista de doenças mentais, sendo seguida por várias outras organizações ao redor do mundo.

Por fim, em uma realidade mais próxima da nossa atualmente, mulheres transsexuais, que são majoritariamente agredidas pela sociedade, não só fisicamente como também psicologicamente, também precisam de atenção. Embora a homossexualidade não seja mais considerada uma doença no que se diz respeito a saúde, a transexualidade não foi inclusa.

A transexualidade é definida como um transtorno de identidade de gênero, na qual o indivíduo não se identifica com o seu gênero biológico. Este diagnóstico, portanto, inclui pessoas transexuais e travestis.

Geralmente, as pessoas transexuais procuram o auxílio médico para realizar a cirurgia de redesignação sexual. Contudo, para que se inicie o procedimento para que isso ocorra, é necessário que estas pessoa sejam diagnosticadas com o transtorno de identidade de gênero. 

Levando em consideração que o desejo de mudança de sexo surge com a certeza do não-pertencimento ao gênero biológico, esse método dificulta o acesso destes indivíduos ao Sistema de Saúde, propiciando também que estas pessoas se mutilem. Isso pode ser observado no caso de Simone Rodrigues da Silva, uma mulher trans que cortou os próprios testículos com um estilete e costurou o corte, tudo isso sozinha e em casa. 

Segundo a própria, ela tomou essa decisão após recorrer ao Sistema de Saúde para realizar a cirurgia de redesignação sexual e receber a notícia que ela deveria passar por um acompanhamento psicológico de dois anos para que ela pudesse entrar na fila. Esse é o procedimento padrão nestes casos atualmente. 

Com isso, a história já demarca a necessidade de atenção à essa comunidade que passou por tantas dificuldades ao longo dos anos, principalmente, mas não exclusivamente, acerca da saúde.


Problemas 

Como visto no tópico anterior, a comunidade LGBTQ+ passou, e ainda passa nos dias de hoje, por muitas dificuldades no quesito saúde, mas também em quesitos políticos, sociais e econômicos. No entanto, o propósito do texto é falar sobre os problemas da saúde, então vamos nos atentar a isso.

Gays



O homem gay, principalmente o afeminado, enfrenta uma sociedade machista e homofóbica desde o começo da sua vida. Ainda na adolescência, enquanto ainda está descobrindo e explorando sua sexualidade, o jovem gay precisa ouvir comentários dos familiares acerca da necessidade de entrar em um relacionamento heterossexual (vulgo “e as namoradinhas?", entre outros). 

Isso, assim como a falta de diálogo em relação a tópicos como sexo, sexualidade, e outros assuntos considerados tabus pela sociedade, faz com que ele se retraia, muitas vezes achando que está errado em se sentir daquela maneira, visto que as pessoas ao seu redor discursam dessa forma. Esse tipo de comportamento é extremamente prejudicial ao adolescente, que muitas das vezes recorrem a atitudes devastadoras, como tirar a própria vida.

Um estudo realizado na Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, onde participaram jovens de 13 a 17 anos, indica que gays são cinco vezes mais propensos a cometerem suicídio comparados a jovens heterossexuais. Além disso, o ambiente de convívio também foi um grande dado da pesquisa onde, locais dos quais as pessoas eram mais abertas a tratar a homossexualidade com a normalidade que se deve, a taxa era menor. 

Além disso, os gays afeminados enfrentam um preconceito ainda maior perante a sociedade. Isso porque estes demonstram mais que não pertencem a normalidade heterossexual imposta, com isso, enfrentam ainda mais preconceito comparado com aqueles que não demonstram tanto a sua feminilidade. 

Homofobia, descrito como “ódio explícito”, ou uma série de atitudes e sentimentos negativos frente a indivíduos homossexuais, ocorre com frequência há bastante tempo. Esta, muitas vezes sendo homofobia institucionalizada (como aquelas provindas de religião ou o Estado) e a homofobia internalizada (partindo daquelas pessoas que sentem atração pelo mesmo sexo mas a reprimem). 

Desde muito novos, os homens gays passam por experiências homofóbicas, na maioria das vezes, dentro da sua própria casa ou na escola. Em ambientes escolares, a homofobia disfarçada de bullying ocorre com frequência. E isso se estende ao ambiente hospitalar também.

Os homens gays muitas vezes são discriminados no próprio hospital quando chegam para atendimento. Às vezes, vítimas de agressão, esses indivíduos sofrem ainda mais preconceito no atendimento hospitalar, reflexos da nossa sociedade.



Lésbicas



Já no caso de mulheres que mantêm relações sexuais e afetivas com outras mulheres, ou seja, lésbicas e bissexuais, o problema é relacionado ao lado preventivo da saúde. Mulheres, independente de sua sexualidade, precisam fazer um acompanhamento médico-ginecológico preventivo desde muito cedo. Doenças como câncer de mama e do colo do útero são, muita das vezes, diagnosticadas tardiamente nesse grupo porque estas mulheres não se sentem confortáveis ao frequentar um serviço de saúde. 

Além disso, existem também questões acerca da psique dessas mulheres. É relatado por muitas mulheres em relacionamentos homossexuais um sofrimento psicológico bem agravante desencadeado pela violência física sofrida em casa, nas ruas e no trabalho. Esse tipo de sofrimento é constante, o que causa que estes indivíduos (não só estes, como outros também) procurem drogas ilícitas, o que agrava ainda mais a saúde dessas mulheres.

Ainda assim, temos a preocupação acerca das Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs). Existem dois aspectos que preocupam a Rede Feminista de Saúde, uma articulação política nacional do movimento de mulheres, feminista e anti-racismo, criada em 1991: a primeira delas é a falta de conhecimento dessas mulheres a respeito de ISTs em relações sexuais entre mulheres; e a segunda é a observação de casos de doenças como HPV e herpes em mulheres que nunca tiveram relações heterossexuais.

Esses tipos de casos acerca da transmissão de ISTs em relações entre mulheres parte da falta de informação delas sobre o assunto, o que poderia ser prevenido com um acesso melhor ao Sistema de Saúde.


Transexuais e travestis



Se homossexuais já enfrentam dificuldades no Sistema de Saúde por não se enquadrarem em um padrão, agora imagine pessoas trans. Pessoas transexuais são aquelas que não se identificação com o seu gênero biológico. Com isso, elas acabam ficando no topo do ranking de preconceitos e discriminações enfrentadas pela comunidade LGBTQ+, isso porque elas desafiam a regra imposta pela sociedade heteronormativa, onde homem é homem, mulher é mulher e estes devem fazem as coisas de acordo com o seu gênero e qualquer coisa que fuja disso é encarado com repulsa. Muitas das vezes, essa repulsa custa vidas de membros dessa população.

Como qualquer coisa que fuja da binaridade padrão causa estranhamento, as travestis acabam sendo postas ainda mais na marginalidade pois quebram a divisa entre o masculino e o feminino. 

Como já foi mencionado, em 1990 a OMS retirou a homossexualidade da lista de doenças mentais. Contudo, isso não ocorreu acerca da transexualidade. Travestis e transexuais são identificadas como indivíduos portadores de uma patologia na qual é chamada como disforia de gênero, ou transtorno de identidade de gênero. 

TIG, ou Transtorno de identidade de gênero, é descrito como uma condição da qual o indivíduo sente um grande desconforto relacionado a características e marcas sexuais atribuídos a ele ao nascer. 

Sendo assim, esta parcela da comunidade LGBTQ. enfrenta um grande estigma social. Muitas das vezes, esses indivíduos se vestem e se comportam de acordo com o gênero do qual se identificam, causando estranheza às pessoas presentes no seu ambiente de convívio. Isso, somado ao preconceito enraizado na sociedade, fazia com que essas pessoas acabassem sendo exiladas do meio social que conheciam. 



Algumas pessoas dizem que a epidemia de AIDS beneficiou essa parcela da população, porque fez com que elas fossem introduzidas apropriadamente no Sistema de Saúde. Antes do HIV, uma travesti ou transexual dificilmente procuraria uma assistência médica em caso de necessidade. Muitas das vezes elas se automedicavam, recorrendo ao atendimento hospitalar apenas em último caso, só quando a automedicação não funcionava. Ocasionalmente abusavam de diversos hormônios, na maioria das vezes, indicados por trans mais velhas, o que nem é necessário alertar o quão perigoso isso é.

Ademais, algumas possuíam a prática de utilizar silicone líquido industrial, muita das vezes aplicado por pessoas que não possuíam conhecimento nenhum da área da saúde. Este procedimento, obviamente, era ilegal, visto que isso é considerado um procedimento cirúrgico e há uma série de cuidados que devem ser seguidos para que não ocorra agrave a saúde. Quando acontecia de uma dessas trans precisar de atendimento, os médicos se recusavam a cuidar, alegando que não poderiam tratar pois não conheciam as causas e os efeitos do que estava acontecendo com aquelas pessoas.

Hoje em dia muitos indivíduos se perguntam o motivo de pessoas trans recorrerem a esse tipo de procedimento tão invasivo. Mas o que eles não entendem é que esse tipo de produto tinha um efeito mais rápido no corpo comparado aos hormônios, proporcionando às trans o corpo desejado de uma maneira mais rápida.

Além disso, há também dois outros quesitos a serem tratados: o primeiro seria o social, no qual essas pessoas, que muitas vezes são postas para fora de casa por não serem compreendidas pelos seus familiares e acabam sofrendo violência física por serem quem são; e o segundo, não se distanciando muito do preconceito, seria o educacional, visto que muitas vezes os profissionais da área da saúde não sabiam lidar com essa comunidade. 

Podemos adicionar também as dificuldades enfrentadas por essa população a questão do procedimento da transição de gênero. Para uma pessoa se aplicar ao procedimento é necessário um acompanhamento por uma equipe, formada principalmente por psicológicos e cirurgiões, que vão explicar todas as fases para ter certeza que é isso mesmo que a pessoa deseja e precisa. Contudo, esse acompanhamento pode durar dois anos ou mais. 

Até o momento da cirurgia propriamente dita, o indivíduo é submetido a tratamentos hormonais, dos quais ocorre o bloqueio hormonal, visando não desenvolver características sexuais como o crescimento de seios, menstruação, o crescimento de barba, o engrossamento da voz, entre outros, tudo acompanhamento pela equipe médica.

Entretanto, tudo é muito lindo na teoria, mas quando chegamos na prática vemos que não é bem assim que funciona. Vemos muitas destas pessoas reclamando da burocracia desse tipo de atendimento e a precariedade no atendimento médico que recebem, muitas vezes partindo de profissionais que as discriminam, fazendo com que essas pessoas tomem decisões graves como cortar os próprios membros sexuais em casa, usando um estilete.

Com isso, a lista de problemas para essa fração da comunidade LGBTQ+ só aumenta, e a maneira como a sociedade lida com isso, principalmente o Sistema de Saúde, só piora.



Leis que amparam LGBTs na saúde 



Ao longo dos anos, com o avanço das pesquisas na área da psicologia, diversas leis homofóbicas ao redor do mundo foram modificadas. Ainda há países que tratam a homosexualidade como uma doença e até mesmo possuem pena de morte para quem demonstre ou assuma uma orientação sexual ou identidade de gênero diferente da heterossexual e cisgênero. 

Nos EUA, até 1962 havia uma lei que criminalizava relações homoafetivas e expressões de diversidade, como homens vestindo-se de mulher, em New York essa lei permaneceu até 1980. No final de 2009, David Bahati, um deputado da Uganda, fez uma proposta ao Parlamento com um projeto de lei que criminalizava a homossexualidade, assim como sua promoção, entre outras condutas, com penas de prisão perpétua para os delitos.

No entanto, esse tipo de abordagem tem mudado nos últimos anos. Alguns políticos têm escutado as necessidades da comunidade e criado projetos de leis com o intuito de melhorar a qualidade de vida e a aquisição de direitos por parte dessa população. O caso mais recente foi a criminalização da homofobia no Brasil, em 2019, onde o Supremo Tribunal Federal (STJ) determina que a discriminação contra pessoas LGBTQ+ seja enquadrada nos crimes previstos na Lei Nº 7.716/1989 (Lei do Racismo) até que uma norma específica seja elaborada. 

No âmbito da saúde, a Política Nacional de Saúde Integral de LGBTQs foi instituída em dezembro de 2011 no intuito de promover a saúde integral LGBTQ+ eliminando a discriminação e o preconceito institucional. Essa Política reconhece que a discriminação das identidades de gênero e orientações sexuais causam um agravo à saúde nessa comunidade.

Estão incluídos nesta política: 

I- respeito aos direitos humanos LGBT contribuindo para a eliminação do estigma e da discriminação decorrentes das homofobias, como a lesbofobia, gayfobia, bifobia, travestifobia e transfobia, consideradas na determinação social de sofrimento e de doença;

II - contribuição para a promoção da cidadania e da inclusão da população LGBT por meio da articulação com as diversas políticas sociais, de educação, trabalho, segurança; 

III - inclusão da diversidade populacional nos processos de formulação, implementação de outras políticas e programas voltados para grupos específicos no SUS, envolvendo orientação sexual, identidade de gênero, ciclos de vida, raça-etnia e território; 

IV - eliminação das homofobias e demais formas de discriminação que geram a violência contra a população LGBT no âmbito do SUS, contribuindo para as mudanças na sociedade em geral; 

V - implementação de ações, serviços e procedimentos no SUS, com vistas ao alívio do sofrimento, dor e adoecimento relacionados aos aspectos de inadequação de identidade, corporal e psíquica relativos às pessoas transexuais e travestis; 

VI - difusão das informações pertinentes ao acesso, à qualidade da atenção e às ações para o enfrentamento da discriminação, em todos os níveis de gestão do SUS; 

VII - inclusão da temática da orientação sexual e identidade de gênero de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais nos processos de educação permanente desenvolvidos pelo SUS, incluindo os trabalhadores da saúde, os integrantes dos Conselhos de Saúde e as lideranças sociais;

VIII - produção de conhecimentos científicos e tecnológicos visando à melhoria da condição de saúde da população LGBT; e

IX - fortalecimento da representação do movimento social organizado da população LGBT nos Conselhos de Saúde, Conferências e demais instâncias de participação social.



Além disso, o processo transexualizador também foi um direito adquirido pela comunidade trans. Instituído pela Portaria nº 1.707 e nº 457 de agosto de 2008 e ampliado pela Portaria nº 2.803, de 19 de novembro de 2013, garantindo um atendimento respeitoso à pessoas trans desde o uso do nome social, concedendo acesso a hormonioterapia, até a fase da cirurgia de readequação do corpo à sua identidade.

O procedimento ocorre de acordo com a seguinte estrutura:

I - Atenção Básica: é o componente da Rede de Atenção à Saúde (RAS) responsável pela coordenação do cuidado e por realizar a atenção contínua da população que está sob sua responsabilidade, adstrita, além de ser a porta de entrada prioritária do(a) usuário(a) na rede;

II - Atenção Especializada: é um conjunto de diversos pontos de atenção com diferentes densidades tecnológicas para a realização de ações e serviços de urgência, ambulatorial especializado e hospitalar, apoiando e complementando os serviços da atenção básica de forma resolutiva e em tempo oportuno.



No caso da atenção especializada, ainda existem dois componentes: o ambulatorial e o hospitalar. No ambulatorial ocorre o acompanhamento clínico, onde acontece a hormonioterapia, assim como as fases de pré e pós-operatório. Já no hospitalar é onde acontece a realização da cirurgia, além do acompanhamento pré e pós-operatório. 

Mesmo com a aquisição de todos esses direitos no papel, vale ressaltar que o estigma social perante a essa comunidade ainda é muito grande, o que não garante o cumprimento dessas leis, visto que ainda há uma tradicionalidade enorme que impede a aceitação de certos comportamentos fora do padrão.




Em maio de 2020, O STF finalmente finalizou uma votação que estava em andamento desde 2017, derrubando a proibição de doação de sangue por pessoas LGBTs que tiveram relações sexuais com pessoas do mesmo sexo em um período de 12 meses, algo que não era cobrado de pessoas heterossexuais, mesmo que estas mantivessem relações com múltiplos parceiros. Na votação, uma maioria de 7 votos a favor e 4 votos contra, o STF considerou inconstitucionais as normas do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Com isso, a partir desta data, está permitido a doação de sangue de pessoas LGBT. Contudo, obviamente, há problemas. De acordo com o jornal Estado de São Paulo, hemocentros ao redor do país continuam rejeitando doações dessa comunidade. Segundo um ofício elaborado pela ANVISA e distribuído pelo portal do Ministério da Saúde, eles orientam que os laboratórios continuem negando a coleta até que haja conclusão total do trâmite, visto que a decisão ainda não havia sido postada no Diário Oficial da União.  No entanto, integrantes do STF afirmam que a decisão entra em vigor imediatamente após a conclusão do julgamento.



Conclusão

Portanto, mesmo com a comunidade adquirindo direitos melhores a cada ano, os problemas permanecem porque, como já mencionado, na prática o jogo rola de uma maneira completamente diferente. Profissionais de saúde preconceituosos negando atendimento a uma pessoa homossexual que acabou de sofrer uma violência que partiu de homofobia, ou não tratando uma pessoa trans pelo nome social, entre outras situações que temos consciência que acontecem.

Com isso observa-se a necessidade de tratar de assuntos como sexualidade desde muito cedo, para que o indivíduo cresça sabendo as diferenças, entendendo as dificuldades que essa comunidade passa, e podendo assim aprender a respeitá-las. Respeito e empatia talvez seja o que está nos faltando.

Além disso, ainda na área da educação, se faz necessário disciplinas e cursos ofertados à profissionais de saúde em formação relacionados diretamente a questões de identidade de gênero e orientação sexual (além de outras questões de minorias que também ainda encontram problemas no Sistema de Saúde) e aprendam assim a lidar melhor com as pessoas dessa população. Ainda assim, também é necessário uma punição mais rigorosa para aqueles que descumprirem as leis, aumentando junto a fiscalização para garantir o cumprimento delas. 

Para essa parcela da população, a violência física e emocional enfrentada já é prejudicial o suficiente e representam um agravo significativo à saúde deles. É necessário que essas pessoas tenham um acesso melhor a saúde, principalmente a pública, aderindo procedimentos como os mencionados acima, garantindo um melhor atendimento médico à eles.

Esse foi o post de hoje. Amanhã continuamos com a Semana do Orgulho LGBTQ+! J-J



Por: Thiago Nascimento e Milena A. Soares
Ilustrações: Milena A. Soares

4 comentários :

  1. Parabéns pela reportagem e esclarecimentos.

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  2. Gostei muito de ler. Mas cheguei ao fim muito cansado, lol
    .
    Saudações amigas

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  3. Muito interessante e esclarecedor esse post

    Beijos
    www.pimentadeacucar.com

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  4. Um post completo sem nenhuma sombra de duvidas 😍 E bem complicado pro pessoal que faz parte da comunidade viver nesse país, principalmente nos ultimos meses com esse presidente otario.

    Abraços
    Emerson
    https://territoriogeeknerd.blogspot.com/?m=1

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